sábado, 14 de maio de 2011

Relação do reporte, fontes e seus dilemas

Uma ex-colega de Metro me pediu um depoimento sobre ética, que ambos julgamos oportuno.

Gosto muito do pensamento do Abramo a respeito (que cito e resumo no post anterior), um exímio jornalista, e sigo a mesma linha de raciocínio.

De fato, creio que a ética dos jornalistas não difere da ética do cidadão comum, pois não somos pessoas privilegiadas com um mandato sobrenatural para guiar os povos. Nossa relação com as fontes deve se pautar pelos mesmos princípios que pautamos nosso relacionamento com outros seres humanos em nossa vida privada. Podemos bem considerá-las, só para breve efeito de comparação, um colega de trabalho ou universidade, um vizinho, um professor, um médico, um dentista, com o qual temos pouca intimidade, mas cujas opiniões ouvimos - ainda que delas discordemos.

Nosso trato pessoal com essas pessoas é normalmente cordial e respeitoso, no sentido que não mentimos a elas, não procuramos desencaminhá-las ou trair sua confiança; se um motorista lhe pergunta, na rua, como chegar a determinado ponto, você explica ou diz ignorar o caminho. Mentir sim seria antiético.

O relacionamento com as fontes parte desse mesmo princípio, porque o jornalista é antes de tudo um ser humano, inserido no tecido social - não importa seu destaque nele. Não se mente às fontes, dizendo, por exemplo, que está fazendo uma pauta sobre isso enquanto o que interessa é uma declaração desavisada sobre aquilo. Não se pede um off the record para publicá-lo na primeira oportunidade. Não se finge ser o que não é.

Embora tenha os mesmos dilemas éticos de qualquer cidadão, o que sucede no jornalismo é eles surgem com mais freqüência, dada a exposição e poder de divulgação do jornalista. No caso do assassino que relata o seu crime ao jornalista, qual o proceder ético? No limite, é o mesmo drama para cada cidadão. Qual seria o dever ético do vizinho que ouve tal relato? É possível e desejável divulgar a versão do criminoso, desde que essa não implique na destruição de vidas. E se implicarem na destruição de qualquer chance de defesa do próprio criminoso? Devem ser colocadas em pratos limpos: não podemos acuar a fonte desavisada, é nosso papel também fazê-las compreender a repercussão de seus atos. Não se trata de desenvolver personagens ficcionais de folhetim, mas de relatar todos os ângulos de uma história.

Mas os jornalistas trabalham para empresas de comunicação, e devem, naturalmente, se alinhar aos padrões, inclusive éticos, apregoados nessa empresa. Como o psicólogo que não viola o sigilo dos pacientes, ou o padre que ouve a terrível confissão, que optaram, em dado momento de suas vidas, por seguir o padrão ético de sua empresa - no qual a não-traição à fonte é a regra primeira.

O jornalista deve se alinhar a esse padrão, deve, como diz Abramo, decretar um armistício consigo mesmo para não contaminar a fonte com o seu próprio discurso. Não obrigá-la a falar bem ou mal do comunismo ou do capitalismo de modo a confirmar seu próprio credo.

A ética do jornalista é a ética do cidadão. Deve preservar vidas. Não pode difamar ou caluniar. Jamais incita o descumprimento das leis - ainda que possa e deva, a todo momento, trazer esses debates à tona, pois é missão da imprensa problematizar a sociedade em que se insere. Se sabe de fato que ponha em risco uma vida, deve debatê-lo com seus superiores e, via de regra, omití-lo. Se lhe é confidenciado um crime, deve denunciá-lo, conforme sua consciência, na mesma medida de suas ações como cidadão. Não se produzem manchetes à custa de mentiras, engodos, vidas, reputações, distorções de fatos.
Grupo 6

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